Última alteração: 2019-06-02
Resumo
O povo Mbyá Guarani está presente na região oriental do Paraguai, no nordeste da Argentina, no Uruguai e no Brasil. Esse contínuo território, entre quatro países, é marcado pela busca por locais que permitam o modo de ser Guarani (mbyá reko), trilhando caminhos sagrados que os ancestrais Mbyá (Nhanderu Miri) fizeram, cujos sinais de sua passagem são casas de pedra (Tava), espaços possíveis de garantir transcendência humana e para se erguer aldeias (tekoa). As ruínas São Miguel Arcanjo, no município de São Miguel-RS, são vistas pelo Mbyá como uma Tava, local onde viveram seus antepassados e referência para afirmação de sua identidade e transmissão da memória ancestral. Face a sua importância para este povo e diante da necessidade de reconhecê-los como protagonistas da história missioneira, o bem imaterial Tava foi inscrito em 2014 pelo IPHAN no Livro de Registro de Lugares, sendo reconhecido recentemente como Patrimônio Cultural do MERCOSUL. É visível um avanço no que se refere à visibilidade indígena e na ampliação do conceito de patrimônio. No entanto, ainda é possível observar no Museu das Missões e na relação do Sítio com a memória indígena um discurso oficial que coloca os Guaranis em um papel secundário no sistema missioneiro, acarretando na invisibilização da presença indígena no passado e sua permanência no presente. A análise tem como base o Sítio São Miguel Arcanjo, e visa a reflexão sobre a relação entre patrimônio e mbyá Reko, investigando o tratamento dado à memória oriunda das culturas tradicionais, desde seu silenciamento na historiografia oficial e na preservação elitista, até o atual reconhecimento e inclusão de aspectos imateriais. Também busca abordar a distinção histórica e teórica existente entre as políticas de patrimônio material e imaterial, bem como propor uma análise do discurso do Museu das Missões e verificar a necessidade de sua atualização. Dentre as indicações de salvaguardas contidas no Dossiê do IPHAN para registro da Tava como patrimônio imaterial, encontram-se as propostas de criação de museu indígena e realização de mediação indígena. Esses apontamentos alinham-se a estudos de Museologia Indígena e comunitária, bem como a propostas de descolonização museal. Espera-se que esse estudo contribua para a potencialização e reconhecimento da memória viva do povo Mbyá Guarani através da iniciativa, no campo museal gaúcho, da criação de um museu indígena missioneiro e da elaboração de uma rede de museus indígenas da Região Sul.